Certo dia, uma menina de 7 anos apreensiva porque se aproximava o dia da primeira prova da sua vida escolar, chega para a mãe com uma montanha de livros nas mãos, uma cara de pavor, suspira e diz:
- Mamãe, amanhã tenho a minha primeira prova na escola, estou com medo e nervosa. Tem uma tal de nota que se eu não alcançar estou frita. Além de não saber bem o que é prova, a professora me mandou não esquecer de fazer uma coisa importante: estudar.
Mas, mamãe, onde tem explicando o que é estudar?
Qualquer semelhança com fatos reais não é mera coincidência...
O que será que se passava, naquele momento, na cabeça da menina?
( )Mamãe, estou fu... porque não sei o que é prova, que diabos é a nota que tenho que alcançar e muito menos o que significa estudar para essa coisa!
( )Sou um extraterrestre e as pessoas falam outra língua neste planeta chamado escola!
( )Estão todos contra a mim e a minha professora comanda o time adversário!
Permito-me sair dos meus lençois e cobertores com cheiro de férias para vir aqui postar uma entrevista bastante interessante dada à Radio Câmara, pelo professor da USP Vitor Henrique Paro sobre a nossa velha e ultrapassada educação, com ênfase a educação das crianças.
Aqui, alguns fragmentos da entrevista e logo abaixo, o vídeo com a entrevista na íntegra.
"Os alunos são expulsos da escola. Os alunos, os pais, querem estudar. Acontece que a escola é muito ruim, a escola, salvo raras exceções, não atende as necessidades e os anseios nem da população e muitíssimo menos dos alunos. Então se um lugar que é a escola, que seria um centro de cultura, das coisas mais necessárias e que o homem mais tem interesse, que é apropriar-se de conhecimentos, valores, ciência, filosofia, artes, compor a sua personalidade, transformar-se. Se esse lugar é recusado pelo aluno, é porque esse lugar não está atendendo a esses objetivos."
Vítor Paro destaca que a escola usa métodos de séculos atrás, sem conseguir construir no aluno o desejo de aprender. Levar o aluno a aprender a querer aprender é o primeiro mandamento da didática.
"A própria escola que é organizada em salas de aula já é um modelo antigo. Há mais de 70 anos, - quem lê Piaget, Vygotsky - esse pessoal todo do século 20, foram feitas pesquisas que a pior forma de ensinar uma criança, até por volta de 11, 12 anos, é alguém que explica e ela que ouve. (...) Suponhamos que a escola devesse passar só conhecimentos, que é o que a nossa escola se propõe, mesmo isso precisaria ser passado de uma forma integral, de uma forma interessante, de uma forma que levasse a criança a querer aprender. E a pior forma de ensinar é botar as crianças sentadas, isso não é forma de ensinar, isso é um sacrifício."
Vítor Paro diz que é um crime de lesa-pedagogia colocar crianças sentadas e confiná-las numa sala de aula durante 4, 5 horas por dia. Para o educador, essa é uma forma de fazer com que a criança odeie o ensino.
"A criança só se prepara para viver se ela viver bem. Viver bem para a criança significa brincar. Então a escola, antes de tudo, deveria ser um lugar onde se pudesse brincar. A primeira coisa que as nossas escolas, baseadas em métodos jesuíticos ainda, do século 16, 17 é proibir a criança de brincar. Não pode conversar com o outro, não pode conversar na aula. Que aula vagabunda é essa em que não se pode conversar? A escola está toda estruturada para um ensino atrasado. A escola devia estar estruturada em turmas pequenas de crianças, que fossem orientadas por adultos, mas que tivessem o adulto no seu próprio nível. ... Porque é diferente? Existem zilhões de métodos novos que ensinam a criança a brincar. Não é difícil, é muito fácil, e dá para ensinar toda a matemática e geografia, muito mais do que se ensina hoje, e dava ao mesmo tempo para desenvolver a personalidade da pessoa."
" Uma Didática da Invenção" I Para apalpar as intimidades do mundo é preciso saber: a) Que o esplendor da manhã não se abre com faca b) O modo como as violetas preparam o dia para morrer c) Por que é que as borboletas de tarjas vermelhas têm devoção por túmulos d) Se o homem que toca de tarde sua existência num fagote, tem salvação e) Que um rio que flui entre 2 jacintos carrega mais ternura que um rio que flui entre 2 lagartos f) Como pegar na voz de um peixe g) Qual o lado da noite que umedece primeiro. etc etc etc Desaprender 8 horas por dia ensina os princípios.
II Desinventar objetos. O pente, por exemplo. Dar ao pente funções de não pentear. Até que ele fique à disposição de ser uma begônia. Ou uma gravanha. Usar algumas palavras que ainda não tenham idioma.
III Repetir repetir - até ficar diferente. Repetir é um dom do estilo.
(...) XIII As coisas não querem mais ser vistas por pessoas razoáveis: Elas desejam ser olhadas de azul- Que nem uma criança que você olha de ave."
Você lembra da primeira vez que entrou numa sala de aula? Quando comecei a minha Odisséia pedagógica, eu ainda estava fazendo faculdade e apareceu um anúncio para estagio em uma ONG. O Anúncio em papel A4 timbrado, se perdia no imenso mural do corredor da Faculdade, entre cartazes e demais poluição visual, mas aquela oferta de estagio me seduziu... Fiz de tudo pra conseguir a vaga, fui bem em todas as etapas, até que o resultado foi positivo pra mim. Aí fui eu para o meu primeiro dia de trabalho, eu sabia que ia pegar uma turma de 20 crianças com idade entre 7 e 10. Nem é preciso ter experiência escolar pra saber que nessa idade as crianças têm muita energia, então resolvi que minha primeira aula seria de expressão corporal. Planejei a aula toda amarradinha com os tempos bem distribuídos. Começando em circulo (pra ser mais democrático) com relaxamento, um alongamento, jogos de improvisação e fechamento da aula com o depoimento corporal das crianças sobre a experiência. Só em sonho, mesmo...
Ou melhor, só na teoria, pra uma aula acontecer tão bem como planejada.
Quando a aula começou... Eu só consegui ouvir os nomes das crianças e quando começamos a primeira parte da aula (o tal relaxamento) em cinco minutos a turma se dispersou totalmente, os meninos corriam a trás das meninas e gritavam e brigavam e mordiam, enquanto outros riam de tudo e todos riam de mim, que não tinha o menor controle da situação. Senti-me como um patinho de borracha preste a cair no vaso em pleno momento da descarga.
Desesperei-me , chamei , pedi, gritei, falei baixinho, com carinho, implorei e nada. Ninguém me ouvia. Ou nem queria me ouvir . Ninguém tava nem aí pra relaxamento ou expressão corporal ou qualquer sorte do que eu tivesse planejado.
No meio do desespero eu me joguei no chão e comecei a gritar: ...AAAAAHAAAAHAHAHAH...sem parar...AAAAAHAHAHAHAAAA... Cada vez mais alto... AAAAAHAHAHAHAAAA... E mais e mais... AAAAAHAHAHAHAAAA... É bem verdade que aproveitei a oportunidade pra soltar o grito de medo e o pavor de estar naquela situação sem nenhum controle, mas aos poucos o meu surto foi chamando a atenção das crianças, que iam aos pouco se aproximando em silêncio, com uma pergunta nos olhos:
"Professor, tá tudo bem? O Senhor tá bem? " Aí, eu me sentei e respondi pra eles: “eu pensei que vocês queriam gritar, então eu também comecei a gritar...”.
Primmmmmmmmmmmm... Tocou o sinal, acabou a aula!
Assim acabou a minha primeira aula. Quando saí de lá eu só pensava em chegar logo em casa, mais precisamente no meu banheiro e dar a minha descarga no meu controle.
Caros amigos, Ao assistir esse vídeo, fiquei impressionada com a sabedoria do entrevistado. Vale a pena, assistir e refletir o que a escola pode ou não representar na vida de uma criança. E também que acima de tudo, ela não é tão poderosa assim...as pessoas sobrevivem a ela.
Chegou a época de trocarmos a decoração, limparmos a casa e quem sabe enconder a sujeira pedagógica debaixo do tapete...
Socorrooo!!! Haja coisinha bonitinhas para fazer, desperdício de material e além tudo ideias mirabolantes!
No chuveiro, procurando essas ideias sensacionais ou quem sabe mais um molde de bichinhos para compor a decoração da minha sala, lembrei de uma vez ter ouvido de uma colega:
"Professor não é que nem gôndola de supermercado que tem uma promoção nova todo dia"
Envolver os alunos, aulas shows, super projetos... A água fria caindo e eu refletindo que não temos tempo para sermos criativos ou para ao menos cultivar nossa criatividade. Isso porque nosso tempo na escola (e em casa) durante o semestre se resume em fazer provas, atividades, planejamentos e correções. Que horas posso ler um livro ( não, não o didático)? Que horas posso ficar cultivando meu ócio, quem sabe visitando uma exposição, assistindo um filme, ouvindo música que seja...
Nas minhas férias, é claro...E trate de voltar com promoções para o restante do ano ok?
P.S: Que fique bem claro, não queremos folga ou trabalho mole...queremos qualidade de vida para fazermos um trabalho de qualidade.